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O Censo 2022, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e EstatĂstica (IBGE) nesta quarta-feira (28/6), revelou que o Centro-Oeste foi a regiĂŁo que registrou o maior aumento populacional do Brasil.
Depois de se impor como potĂȘncia do agronegĂłcio e como hegemonia musical com o sertanejo, a regiĂŁo menos populosa do paĂs, com 16,3 milhĂ”es de habitantes, desbancou o Norte e agora Ă© a que mais cresce. Avançou 1,23% enquanto a população do paĂs cresceu 0,52% nos Ășltimos 12 anos. A regiĂŁo com a menor taxa de crescimento foi o Nordeste, com 0,24%.
Apenas com novos dados do Censo e de futuras pesquisas serĂĄ possĂvel explicar esse crescimento, mas, em entrevista Ă BBC News Brasil, o professor de economia, administração e sociologia na Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP) Carlos Eduardo de Freitas Vian afirmou que o Centro-Oeste atrai muitas pessoas porque se tornou um polo de oportunidades.
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“Isso motiva todas as ondas de migração e ainda estĂĄ acontecendo. Hoje, vocĂȘ tem oportunidades em grandes indĂșstrias que se instalaram no Centro-Oeste.”
“Antes, migrar para a regiĂŁo era uma grande aventura, mas isso mudou e virou uma referĂȘncia no crescimento e geração de emprego, ao contrĂĄrio de outras que estĂŁo em estagnação, seja na agricultura ou no setor de agroindĂșstrias”, diz Vian.
O professor explica que a regiĂŁo oferece empregos em diferentes ĂĄreas alĂ©m do campo, por exemplo na indĂșstria e no setor de serviços.
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O crescimento agrĂcola do Centro-Oeste atrelado a uma crescente preocupação com a ĂĄrea ambiental causou um aumento exponencial, segundo ele, da migração recente de profissionais especializados em certificação ambiental para a regiĂŁo.
A oferta de empregos tambĂ©m pode explicar, ao menos em parte, o boom populacional em algumas cidades da regiĂŁo em relação ao restante do paĂs.
Segundo a mais recente pesquisa PNAD ContĂnua trimestral do IBGE, a taxa de desocupação no Centro-Oeste estĂĄ em 7%, inferior Ă mĂ©dia nacional de 8,8%. Ă a segunda menor taxa do paĂs, Ă frente apenas da regiĂŁo Sul, com 5%.
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Considerando as cidades brasileiras com mais de 100 mil habitantes, aquela que teve a maior taxa de crescimento da população foi uma cidade de Goiås: Senador Canedo, com uma taxa anual de 5,23%.
Esse municĂpio, an regiĂŁo metropolitana de GoiĂąnia, foi o que teve o maior crescimento proporcional da população no acumulado dos anos: em 2010, tinha 84.443 habitantes, passando para 155.635 em 2022 â um crescimento de 84,3%.
HĂĄ vĂĄrias outras cidades do Centro-Oeste no ranking das cidades que mais cresceram, como Sinop (MT) e Sorriso (MT).
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E a influĂȘncia da regiĂŁo vai alĂ©m das questĂ”es mais ligadas Ă produção do agro.
Nas Ășltimas dĂ©cadas, O Centro-Oeste tambĂ©m se tornou um grande celeiro musical do paĂs, principalmente da mĂșsica sertaneja.
SĂŁo dezenas de artistas que despontaram entre os mais populares do paĂs, como MarĂlia Mendonça, Gusttavo Lima, Michel TelĂł e Maiara & MaraĂsa.
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Em um levantamento divulgado em março pela plataforma de streaming Spotify, seis dos dez artistas mais tocados no verão de 2023 nasceram no Centro-Oeste. São cantores que exaltam em parte de suas letras o orgulho de viver da fazenda e viver a vida sertaneja.
Atualmente, a TV Globo também exibe a novela Terra e Paixão, que relata o dia a dia no campo.
Mas, por mais que o professor da Esalq tambĂ©m ressalte o crescimento econĂŽmico e visibilidade da regiĂŁo, ele afirma que ainda estĂĄ longe poder falar que o Centro-Oeste pode se tornar a “locomotiva do paĂs”, jĂĄ que o Estado de SĂŁo Paulo ainda corresponde a cerca de um terço do PIB brasileiro, com 44,4 milhĂ”es de habitantes – cerca de um quinto da população do paĂs.
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Apesar da influĂȘncia cultural e da força econĂŽmica, de acordo com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Centro-Oeste Ă© a regiĂŁo com o menor colĂ©gio eleitoral do paĂs, com 11,5 milhĂ”es de eleitores. A regiĂŁo Sudeste Ă© a maior, com cerca de 67 milhĂ”es, o equivalente a 42% do eleitorado.
A marcha da expansĂŁo
O professor Vian afirma que, para entender o crescimento atual do Centro-Oeste, Ă© preciso retroceder “uns 40 anos”.
“A partir dos anos 1970, o paĂs começou a ter um projeto de integração nacional e expansĂŁo da fronteira agrĂcola. Na Ă©poca, começaram a levar projetos de interiorização, alguns estatais e outros privados. No mesmo perĂodo, começaram a migrar para lĂĄ pessoas do Centro-Sul, como paranaenses, catarinenses e gaĂșchos”, diz o professor.
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Ele explica que essas pessoas vendiam suas terras no Sul e, com o dinheiro, podiam comprar ĂĄreas muito maiores no Centro-Oeste, numa aposta de aumentar a produtividade e a renda.
No inĂcio, explica Vian, a ĂĄrea foi usada majoritariamente para a pecuĂĄria. Mas os fazendeiros adaptaram outras culturas para a regiĂŁo, como a soja e, mais recentemente, o milho.
O constante investimento em infraestrutura, como rodovias, escolas e hospitais tornou a regiĂŁo cada vez mais atrativa.
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O especialista afirma que novas cidades passaram a surgir nesse perĂodo, algumas planejadas. Mas o grande boom começou, segundo ele, a partir dos anos 1990 e 2000, quando o Brasil começou a ganhar importĂąncia no mercado internacional de grĂŁos.
“A grande produção de soja e carne tornou a regiĂŁo importante. Em 1980, iniciou a segunda fase dessa ocupação agrĂcola, com a migração de empresas agroindustriais para a regiĂŁo, com usinas de açĂșcar, etanol e processamento de soja. Nos anos 2000, surgiram as processadoras de carne, frango e uma nova infraestrutura de distribuição e escoamento de produtos agrĂcolas. Isso gerou uma capacidade de aproveitar melhor a produção”, afirmou.
O sonho de Juscelino
Sonho de JK de interiorizar o paĂs a partir da criação de BrasĂlia se realizou, segundo especialista. Foto GervĂĄsio Baptista ArquivoO professor disse que hoje estamos prĂłximos do auge dessa expansĂŁo, com a modernização de cidades, opçÔes de lazer e educação, relevante produção agrĂcola, distribuição e cooperativas de produção.
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Para ele, jĂĄ Ă© possĂvel dizer que o sonho do ex-presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961) de interiorizar o paĂs se realizou. Algo que surgiu a partir da decisĂŁo dele de construir BrasĂlia e transferir a capital para o Centro-Oeste.
“A internalização da capital foi o primeiro passo. A soja foi a principal cultura responsĂĄvel pelo sucesso da regiĂŁo, mas o milho tambĂ©m estĂĄ se tornando relevante. Hoje, ainda existe perspectiva de que uma variedade de trigo desenvolvido pela Empresa Brasileira de Pesquisa AgropecuĂĄria (Embrapa) tenha potencial para ser produzida no Centro-Oeste e expandir novos horizontes em breve”, disse.
O prĂłprio IBGE informou que o Censo revela a força da interiorização da população brasileira, “se destacando numericamente municĂpios localizados tanto no Norte, como no Centro-Oeste, em seguida Ă queles situados no Sudeste e numa faixa contĂnua entre o litoral catarinense e o entorno de Curitiba (PR), no Sul”.
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Carlos Vian explica que um novo modelo de negĂłcio agroindustrial multidisciplinar deve impulsionar ainda mais o crescimento do Centro-Oeste.
“Trata-se do processo no qual temos dentro da mesma propriedade a produção de grĂŁos, a pecuĂĄria e a madeira. Isso deve atrair outras agroindĂșstrias de grande porte, como madeireiras. Ter no mesmo local a agricultura, o gado e a indĂșstria de processamento reduz muito os custos”, afirma.
Os Estados de Mato Grosso e GoiĂĄs sĂŁo apontados pelo IBGE como os destaques do povoamento da regiĂŁo, com crescimento de 1,57% e 1,36%, respectivamente.
“No Centro-Oeste, chama atenção a interiorização do povoamento a partir do eixo que se forma em torno de BrasĂlia-GoiĂąnia, fazendo com que GoiĂĄs se diferencie nessa regiĂŁo pela densidade atingida pelos municĂpios da concentração urbana formada em torno da capital federal e da capital estadual”, diz o instituto.
DependĂȘncia da China
O professor da Esalq afirma que nĂŁo hĂĄ dĂșvidas de que o grande crescimento da regiĂŁo Centro-Oeste ocorreu a partir da melhoria na inserção internacional do Brasil no mercado de grĂŁos a partir dos anos 2000.
O levantamento mais recente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a regiĂŁo Ă© responsĂĄvel por cerca de 50% de todos os grĂŁos produzidos no paĂs. Para a soja, especificamente, o nĂșmero tambĂ©m fica na casa dos 50%.
No entanto, ele diz que Ă© necessĂĄrio tomar cuidado com os riscos que existem devido Ă grande influĂȘncia, principalmente da China, como compradora majoritĂĄria de produtos da regiĂŁo.
“Vender para o gigantesco mercado da China foi uma oportunidade que a gente aproveitou, mas Ă© necessĂĄrio observar os riscos dela. Algo que a gente tem discutido Ă© que temos uma dependĂȘncia muito grande da China e precisamos contrabalançar a importĂąncia desse paĂs”, afirma.
“O ideal seria tentar diversificar um pouco mais nossas exportaçÔes. Talvez conseguir acessar um pouco mais o mercado europeu e fazer um convĂȘnio mais forte com o Mercosul.”
Apesar de esperar por uma safra recorde de soja em 2023, economistas tambĂ©m veem como um alerta o anĂșncio feito pela China de que expandirĂĄ a ĂĄrea destinada ao plantio de soja no paĂs.
A decisĂŁo foi tomada para tentar se aproximar da autossuficiĂȘncia na produção do grĂŁo apĂłs temer um desabastecimento durante a pandemia da covid-19.